Em visita a Livraria do Instituto de Arquitetos do Brasil, encontrei o livro “Pequeno Dicionário do Povo Brasileiro, século XX “, de Lélia Coelho Frota (Aeroplano, 2005). Encontrei uma biblioteca rica em artesãos brasileiros que só regiões como o Cariri abriga. Fizemos uma seleção de alguns escultores para a galeria desta semana:

Nino era cortador de cana-de-açucar, se aventurou a fazer brinquedos para crianças e hoje esculpe blocos enormes de madeira, em exposição nas maiores galerias de arte popular do Brasil. Ciça também se viu escultora na infância, fazendo seus binquedos, se aventurou a esculpir temas religiosos até fazer seus famosos rostos cheios de vida. As três irmãs chamadas Maria trabalham a argila dentro de casa sobre o que há de mais popular e cotidiano da cultura do Cariri. E o pai Manoel e o filho Francisco Graciano imprimem maior humor às suas esculturas de madeira.

Ciça

Cicera Fonseca da Silva nasceu em Juazeiro do Norte, CE, centro de tradições e produção artística popular, em 1932. Trabalha com o barro desde menina, fazendo os próprios brinquedos. Em 1960 começou a moldar santos e cenas regionais. Suas “máscaras” de cerâmica forneceram-lhe uma capacidade expressiva pouco encontradiça entre os artistas do barro, pois Ciça nunca faz “bonecos”, mas pessoas, com rostos onde transparecem emoções e sentimentos.

Fonte: Galeria Brasiliana

Três Marias do Ceará

São três as “Marias” Cândido Monteiro, mãe e filhas, (Maria do Socorro, Maria de Lourdes e Maria Cândido Monteiro), de Juazeiro do Norte, Ceará, e ainda que assinem suas iniciais, não é possível distinguir a autoria de sua peças. A argila é tirada de locais próximos, é trabalhada pela própria família, inclusive os homens (seca, batida, peneirada, molhada e amassada),e são cozidas no forno do quintal. Elas sempre elaboram no mesmo estilo popular temas espontâneos, saídos do cotidiano ou da TV, religiosos ou adaptados de referências medievais, reproduzidas em ilustrações de livros e revistas.

Fonte: Galeria Brasiliana

Nino (João Cosmo Felix)

Cortou cana-de-açúcar e trabalhou como ferreiro antes de dedicar-se à escultura em madeira. Começou sua arte fazendo brinquedos. Analfabeto, viveu em Juazeiro do Norte (CE) com a esposa, Perpétua Cecília da Conceição, até a morte. Sua obra integra importantes coleções públicas e privadas no Brasil e no exterior. Em 1974 fazia animais de madeira assombradamente pintados de marrom e laivos de negro e branco, cuja dimensão maior não excedia em geral 70 cm. As caudas, feitas de imburana de cambão ou timbaúba, eram acrescentadas aos bichos esculpidos. Na década de 1980 dá-se o grande salto de Nino para uma escultura de dimensão maior, que pode ultrapassar 1m de altura. No monobloco de madeira, Nino passa a integrar à forma magistral uma nova invenção da cor. Pássaros, elefantes, bois, macacos, cenas de rituais como casamentos e reisados são esculpidos em alto-relevo ou recortados na parte superior do bloco original, que recebe uma pintura em que certas cores – rosas, azuis, vermelhos, verdes, amarelos -, temperadas e regidas por Nino, constituem-se em uma extraordinária galeria de estelas do sertão. Aí, a força do simbólico se equivale à mestria do olho e da mão, arvoredo do sonho onde a natureza e cultura perfazem um encontro único, à altura da melhor criação contemporânea do século XX. Já expôs individualmente no Rio de Janeiro. Trabalhos seus integraram com destaque a exposição internacional “Brésil, Arts Populaires” (Grand Palais, Paris, 1987), bem como a “Mostra do Redescobrimento” (Fundação Bienal de São Paulo, 2000). Suas obras constam dos grandes museus de arte popular do país.

Fonte: Pequeno Dicionário do Povo Brasileiro, século XX | Lélia Coelho Frota – Aeroplano, 2005

Manoel Graciano e Francisco Graciano

Migrou com a família para Juazeiro do Norte (CE) em 1929. Começou a trabalhar a madeira aos 10 anos, “aprendendo com a natureza” a fazer pilões, gamelas e brinquedos, que vendia para outras crianças. Casado e com três filhos, passou a produzir ex-votos e presépios. Trabalhou na roça por vários anos, até ser revelado pelo xilógrafo e cordelista Abraão Bezerra Batista, que o levou para o Centro de Cultura Popular Mestre Noza. No entanto, apesar da boa aceitação do seu trabalho, não deixa a terra que arrendou a uma légua e meia da sua casa, plantando feijão e milho “para o gasto”.

Sua escultura em madeira vai ganhando em pouco tempo a liberdade da forma própria, autoral. Manuel Graciano compõe grupos com vários personagens que formam um verdadeiro conjunto escultórico, com a possibilidade da permutação das figuras. É parcimonioso nas cores que integra com grande domínio à forma esculpida. Graciano tem um veio de humor que pode crescer até o mais flamejantes expressionismo em muitos de seus trabalhos. Ele prepara suas cores com anilina misturada a breu e álcool, antes de aplicá-las à imburana de cambão ou aroeira em que esculpe. Quando parte para composições talhadas em monobloco de madeira prefere as formas animais à figura humana, pintando-as com pinceladas diferenciadas, sempre com harmonia tonal apurada.

Francisco Graciano é um dos filhos do mestre Manoel Graciano de Juazeiro do Norte – CE. Herdou do pai o talento para esculpir a madeira e criar figuras do seu imaginário. Além do trabalho na madeira, o artista pinta lonas com figuras semelhantes àquelas que ele esculpe.

Fonte:  Galeria Vinicius Xavier
Curadoria e pesquisa: Ana Luiza Gomes