Como quem sabe esperar a carne salgar no ponto certo. Como quem aguarda os olhos se encontrarem antes de emitir ruídos. Como quem cadencia a respiração para não se afobar ao subir as ladeiras. Como quem pula casa por casa da Amarelinha sem ficar ansioso pelo céu. Como quem sabe que o passo devagar é também o mais charmoso do baile.
Caminhe com calma e olhe com atenção.
O Morro da Conceição é um exercício constante de ritmo. As batidas dos tempos estão ali impressas nas pegadas das pedras de quem chegou cansado de navio, de quem trouxe o azulejo europeu pra estampar sua casa no novo continente, de quem está há muito tempo bordando na mesma calçada, de quem chega com vontade de se costurar naquela outra linha do tempo.
O Morro da Conceição é um exercício de permanência. Discreto, vai te ensinando que olhar o céu é escolha de quem também cuida da estrada. As Conceições te fazem repetir a ladainha poética – Rua do Jogo da Bola, Travessa do Sereno, Rua do Escorrega – e sem querer você incorpora o mantra cotidiano da leveza e continua firme, mas sorrindo. E as portas que se abrem mostram a importância de respeitar o que é sábio e de sentir o que realmente merece confiança.
O Morro da Conceição é um exercício sobre misturas. Pode ser um negro escravizado, pode ser um artista paulistano, pode ser um recifense de sotaque carregado, pode ser uma gaúcha que quer valorizar seu novo entorno, pode ser uma menina mineira que coleta amores em ladeiras. Quem tem força pra cuidar dos seus, quem tem raiz pra preservar, quem se interessa mais pela roda de conversa do que pela vitrine das avenidas… basta esperar, com calma, que alguém vai puxar a cadeira pra você sentar.
Certamente, foi bem ali que nasceu o samba.
(Por Mayra Fonseca. Imagem da obra de Heitor dos Prazeres. A pesquisa deste tema recebeu apoio da Farm que arcou com os custos de viagem e hospedagem para imersão local no Rio de Janeiro. Obrigada, Farm).